15. Charlie Brown Jr: “Do Surf”

Em 1999, o rock nacional vivia um grande momento. Foi o ano em que praticamente todas as principais bandas noventistas haviam lançado álbuns inéditos: Pato Fu com Isopor, Raimundos com Só no forévis e O Rappa com Lado B lado A. O Skank não lançou nada novo, porém, continuava surfando o sucesso de seu disco de 1998, Siderado, inclusive apresentando um clipe que se tornaria clássico em sua videografia, “Mandrake E Os Cubanos”. Ainda, no finalzinho do ano, o público roqueiro assistiu ao surgimento de outro conjunto que marcaria a época e, logo, seria alçado àquele primeiro escalão: Los Hermanos, com o arrebatador sucesso de “Anna Júlia”.
Mas uma banda vivia um desafio em particular, enfrentando a tal “síndrome do segundo álbum”. Era o Charlie Brown Jr., que também chegou aos primeiros lugares das paradas de sucesso com duas faixas de seu novo lançamento, Preço curto prazo longo: primeiro, o reggae praieiro “Zóio D Lula”, depois, “Te Levar”, incluída na abertura da série global Malhação.
Hoje, olhando retrospectivamente, fica claro o quanto esse disco refletia a necessidade e a urgência de Chorão, líder da banda, em expressar sua raiva e reivindicar um lugar ao sol. Tal urgência, aliás, era tanta, que Preço curto prazo longo acabou saindo com 25 faixas, num arroubo de megalomonia. Tanta verborragia se dispersava por vários temas, influências e mesmo gêneros: havia composições exalando groove entre guitarras distorcidas (“Confisco”, “Não Deixe O Mar Te Engolir”, “Estória Mal Escrita”, “Quem Deu Entrada Pra Subir?”), lembrando desde o Red Hot Chili Pepers até o Rage Against The Machine, passando pelo nu metal tão em voga naquele fim de século, e colocando em primeiro plano o impressionante trabalho do baixista Champignon; o punk, fosse numa vertente mais pop à Green Day (“Te Levar”), fosse tomando o hardcore como inspiração (“Mantenha A Dúvida E Espere Até Ouvir Falar De Nós”), fosse emprestando a pegada e a temática dos Raimundos (“Cruzei Uma Doida”, “Muito Antes De Você”), aliás, convocados a celebrar a amizade entre as bandas no ska “Bons Aliados”; e falando em ska, havia faixas que retrocediam ao estilo decantado no álbum anterior, Transpiração contínua prolongada (1997), como “A Grande Volta” e “Local”, mas a banda também imprimia novas cores ao gênero, especialmente em “Resolve O Meu Problema Aí”. Como essa miríade de influências já não bastasse, Preco curto prazo longo ainda investia no rap, expressando o quanto Chorão estava à vontade na periferia, com a balada “O Preço” e nas vinhetas “12 + 1”, “O Que É Da Casa, É Da Casa”, “União”.
A verdade é que, atirando para todos os lados, nem tudo em Preço curto prazo longo se salva. O lado mais interessante do disco ainda permanece escondido em meio aos vários hits, mostrando o potencial da banda em injetar novidades no skate rock, aproximando-o do som de Seattle em “Cidade Grande” e “Hoje De Noite”, ou colhendo as vantagens de ter dois guitarristas em “O Puxa Carro”, “Aquele Carteado E Algumas Manobrinhas” e “333” – esta, provavelmente, com algumas das melhores guitarras já gravadas no rock brasileiro.
Outro elemento curioso do álbum, e também inserido à exaustão entre faixas, é a presença das já mencionadas vinhetas ou de temas instrumentais, às vezes, servindo como descanso entre um rock e outro, ou então apenas para sediar brincadeiras e experimentações. Por exemplo, se em “Chicano” a banda testa a possibilidade de um ska acústico com leve sabor latino, em “Depois De Uma Bela Session, Um Belo Sofá, Cerveja, Pizza E Um Videozinho De Skate” há um pastiche de rockabilly. Pois tomo, então, “Do Surf” (surf music, claro, composta pelo guitarrista Marcão) como nosso tema instrumental do dia, sendo, das faixas com esse caráter em Preço curto prazo longo, aquela mais representativa da sonoridade da banda.
Enfim, fosse mais conciso, talvez o álbum tivesse se destacado mais. Mas também não seria um disco de Chorão – e o tempo mostrou o quanto o vocalista da banda de Santos era um sujeito complicado, porém, inspirado e, afinal, com algo a ser dito.