38. Trio Marsicano: “Blue For Hendrix”

São Carlos, 2006. Numa tarde de março, recebo um convite – não posso dizer de quem… porque não lembro – para ir ao Sesc conferir “um tributo a Jimi Hendrix”. Topei na hora e, logo que cheguei, fui surpreendido: primeiro, porque o show aconteceria no saguão de entrada do edifício, local onde nunca tinha visto (e jamais voltei a ver) qualquer apresentação musical acontecer; e segundo, porque a banda, espantosamente, não tinha guitarrista. “Uma celebração de Hendrix, sem guitarra?”, pensei comigo, desconfiado.

Ora, não era preciso me afligir, porque o show foi estupendo, tanto por conta do primeiro estranhamento (sendo no saguão, assisti à apresentação em uma escadaria, que me fornecia uma visão privilegiada), mas, principalmente, pelo fato de que as guitarras foram substituídas por um instrumento que, a mim, sempre me pareceu muito mais interessante: o sitar indiano, empunhado por um veterano de longos cabelos brancos, de presença forte e quase mística. Era Alberto Marsicano, guarnecido por Rodrigo Vitali (bateria) e Andrei Ivanovic (baixo).

Algum tempo depois, uma amiga, Marina, emprestou-me o CD que era vendido ao final do show, trazendo sete faixas, nem todas de Hendrix – ali estavam, também, outros clássicos do rock, “Iron Man” (Black Sabbath), “Set The Controls For The Heart Of The Sun” (Pink Floyd) e “In-A-Gadda-Da-Vida” (Iron Butterfly). Fiz minha cópia, que escutei até gastar, e passei a acompanhar a produção de Marsicano, vindo inclusive a conhecê-lo em 2007 e a trocar uma boa ideia (e lembro especialmente de sua fala a respeito de Jim Morrison, dizendo que o status quo foi quem o matou, mas o tiro saiu pela culatra, pois acabou por eternizá-lo).

Foi somente nos anos 2010 que pude escutar, na íntegra, o disco que registrava o repertório daquele tributo ao maior guitarrista de todos os tempos. Sitar Hendrix (2006) traz 11 faixas, mas não se trata apenas de covers, quer dizer, releituras em que a guitarra é simplesmente substituída pelo sitar. Na verdade, os arranjos propostos pelo Trio Marsicano contam mais como variações sobre os temas principais das canções hendrixianas, numa abordagem quase jazzista daquele repertório. Além disso – e, algumas vezes, com o timbre do sitar turbinado com distorções e outros efeitos, vide a faixa de abertura, “Angel” –, Marsicano convida também os ritmos brasileiros a participarem desse bailado roqueiro e lisérgico. Então, “Fire” surge quase irreconhecível como um baião psicodélico; “Purple Haze” começa e termina como uma catira; e “Third Stone From The Sun” ginga ao som do berimbau. Em resumo, a abordagem do trio é tão pouco óbvia que são poucas as versões reconhecíveis desde os primeiros segundos, como ocorre com “Machine Gun”.

Como tema de hoje, trago a única faixa autoral do disco, “Blue For Hendrix”. Composta pelo próprio Marsicano, é menos um blues que um rock, mas tocado como jazz, no qual o som do sitar improvisa livre e lindamente.

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