49. Carrapicho Rangel: “Deixa A Menina”

Cléber “Carrapicho” Rangel é uma das grandes referências nacionais do bandolim contemporâneo. Primeiro bandolinista formado no conservatório musical de Tatuí, o músico araraquarense ficou conhecido, no interior de São Paulo, por tocar no conjunto de samba Conversa de Botequim. Em Inspirações (2017), o músico faz sua estreia solo, num álbum repleto de composições autorais, ao lado de alguns números alheios – como nosso tema de hoje, “Deixa A Menina”, samba clássico de Chico Buarque, aqui, numa veloz releitura, em que o bandolim parece mesmo mastigar cada sílaba da esperta letra buarquiana; e “Viva O Rio De Janeiro”, originalmente outro samba, dessa vez, de Hermeto Pascoal. A propósito, “Viva O Rio De Janeiro” parece ser o único choro dentre as nove faixas do álbum, algo surpreendente a ser dito sobre o álbum de um bandolinista brasileiro. Na verdade, talvez fosse mais apropriado considerar Inspirações como um disco de jazz. A elegantíssima, linda e complexa “Baião Das Sete” não me deixa mentir: sustentada por um timbre cool de piano elétrico, a obra tem uma nordestinidade que, às vezes, parece associada ao maracatu, outras vezes, ao baião mesmo, com algumas passagens curtas por células rítmicas que me lembram um toque de candomblé. “Rumo A Curitiba” é outra faixa que até pode parecer um choro, sobretudo por vir acompanhada de uma clarineta e por algumas passagens mais maxixadas aqui e ali, mas não se deixa captar tão facilmente por categorias estanques. Há ainda duas faixas mais delicadas, “Uma Valsa Pra Você” (mas, claro, não poderia ser uma valsa banal, e Carrapicho nos surpreende com uma súbita aceleração do andamento na metade do número) e “Passos De Luíza”, singelo tema para bandolim solo que fecha Inspirações. Por fim, destaco o frevo “Me Empresta A Sombrinha” (outra composição alheia, do também araraquarense Fabiano Marchesini), em que o bandolinista brilha com seu virtuosismo elevado à décima potência.