72. Ira!: “Os Meninos Da Rua Paulo”

Na edição 173 da revista Showbizz, publicada em dezembro de 1999, consta uma matéria especial (com nada menos que dez páginas!) dedicada ao Ira!. Assinado pelo jornalista Ricardo Alexandre, o texto aproveitava o lançamento de Isso é amor (que relia o repertório de colegas de geração e de influências) para realizar uma detalhada retrospectiva da carreira de Edgard Scandurra e companhia – das fases mais punks ou pós-punks, passando pela virada mod que levou o conjunto ao estrelato, até as experimentações que culminaram no imbatível Psicoacústica (1988). Mas, no início dos anos 1990, já não havia muito espaço para o BRock, e o Ira! sentiu intensamente o peso dessa época. Eis como a matéria narra a situação da banda quando de seu primeiro disco noventista, Meninos da Rua Paulo (1991):

Meninos da Rua Paulo evocava o velho idealismo, mas encontrou uma banda desestruturada interna e externamente. “Já éramos carta fora do baralho na WEA.” …Rua Paulo trouxe mais uma decepção. “Desse disco eu esperava um grande sucesso”, lembra [o vocalista] Nasi. Para se garantir, a banda resolver sair divulgando uma regravação de “Você Ainda Pode Sonhar”, versão de “Lucy In The Sky With Diamonds”. “Era prato cheio: versão do Raul Seixas para uma música dos Beatles, com sampler de ‘We Will Rock You’, do Queen!”, lembra Edgard. Mas o sucesso não veio. Talvez tenha sido lição do destino: quando o Ira! tentou encarar o pragmatismo da indústria, se deu mal.

Na matéria, um box comentava sucintamente a discografia da banda, assim descrevendo Meninos da Rua Paulo:

Lirismo e guitarras pesadas em um disco sem rumo definido, mas com um punhado de grandes canções.

De fato, o álbum passou praticamente batido, embora tenha legado três canções que apareceriam ou em coletâneas vindouras, ou nas apresentações ao vivo: a mencionada versão para o clássico dos Beatles, o slow blues “Prisão Nas Ruas” e o quase-hit “Um Dia Como Hoje” (especialmente saudado pelo público na gravação do MTV ao vivo de 2000). De resto, há ecos de Psicoacústica aqui e ali (“A Etiópia E Os Meus Problemas” e “Não Matarás”), antecipações do futuro eletrônico que seria explorado no álbum Você não sabe quem eu sou (1998) (“Imagens De Você”) e a tentativa de criar uma narrativa conceitual, justamente inspirada no romance Os meninos da Rua Paulo (do escritor húngaro Ferenc Molnár), com as faixas de abertura e de encerramento, respectivamente, “Rua Paulo” e “Os Meninos Da Rua Paulo”.

Esta, nosso tema de hoje, acabaria se tornando a única faixa instrumental da carreira da banda até então, sendo assinada coletivamente (incluindo o baixista Gaspa e o baterista André Jung) e valendo-se de um pulso tribal, sustentando a exploração de um tema a partir das guitarras de Edgard e de assovios.

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