O autointitulado disco de estreia de Cássia Eller, lançado em 1990, bem representa a época em que ela, antes de enveredar no pop-rock que a colocaria na boca do povo, baseava seu repertório, principalmente, em particularíssimas releituras de compositores da Vanguarda Paulistana – Itamar Assumpção, Mário Manga, Arrigo Barnabé e Hermelino Neder. Cássia Eller também guardava reminiscências do passado da cantora em Brasília, relendo “Por Enquanto” de Renato Russo, e incluía outros nomes oitentistas, os barões vermelhos Frejat e Cazuza. Embora tímida fora dos palcos, Cássia sempre esteve muito à vontade com o microfone na mão, desinibição que ecoa ao longo de todas as faixas do LP. É imbuída desse espírito que a intérprete arrisca fazer um reggae de “Eleonor Rigby”, ou dá vida a uma composição de Bocato, “Otário”. E no ponto mais alto da (justificada) ousadia, Cássia ainda se inclui entre todos esses grandes criadores, apresentando uma bissexta composição própria, sem letra – e, portanto, nosso tema de hoje –, elaborada com Márcio Faraco. “Lullaby” é exatamente como o nome sugere, uma canção de ninar, lânguida e modorrenta, querendo catalisar um adormecer… até que, lá pelas tantas, o sono já se apossou do ouvinte, que mergulha num agitado samba onírico. Mais uma mostra do talento incomparável de Cássia, praticamente escondida num álbum que merecia maior reconhecimento.